domingo, 29 de janeiro de 2012

Coluna A Tarde: Recesso para a Justiça não esquecer

Coluna A Tarde: Recesso para a Justiça não esquecer
Final de janeiro, mês de recesso para os poderes Legislativo e Judiciário. Recesso que será lembrado pelo Judiciário que o atravessou num misto de férias e preocupações com o desgaste da imagem do Poder, que desde sempre tem sido, até aqui, uma espécie de “caixa preta”,  protegido pelo reinado de togas enigmáticas. O Brasil, no entanto, mudou. A democracia estabeleceu o fim das diferenças entre os poderes da República e colocou a Justiça na roda da ciranda, expondo suas chagas à opinião pública. É um recesso para não ser esquecido por determinar mudanças, por tirar as togas do seu inacessível Olimpo e trazê-las à Terra e à realidade do dia-a-dia.
 
O extraordinário desse processo é que o Executivo e o Legislativo ficaram em silêncio observando a agonia do Judiciário, tirado do seu sono de privilégios a partir de uma ação que partiu dele próprio. Tudo começou  de uma provocação feita ao controle externo do Poder, comandado pelo Conselho Nacional de Justiça, o CNJ. Defendendo-o, ascendeu a figura gigante da ministra baiana e corregedora do Conselho, Eliana Calmon, disposta a enfrentar as associações corporativas da classe. O corporativismo é responsável pelo que acontece.

Há, também, como consequência, decisões que deverão ser revistas, ou não, pelo Supremo Tribunal Federal. A corte decidirá sobre a legitimidade de liminares concedidas pelos ministros Ricardo Levandowski e Marco Aurélio. Presume-se que o julgamento acontecerá no início deste mês de fevereiro, até porque os escândalos em tribunais explodem e expõe super-salários de marajás que os brasileiros não imaginavam que existissem.
 
Neste período de recesso o Judiciário brasileiro esteve diariamente exposto pela imprensa brasileira –impressa e eletrônica- que relatou parte da “caixa preta” e vantagens até então desconhecidas em forma de salários somados a  penduricalhos que premiam a magistratura. As togas ficaram rotas. Antes, porém, foi denunciado por Eliana Calmon que elas também eram usadas por bandidos que se misturavam aos bons juízes. Bandidos  que vendem sentenças e outras coisas mais. Aliás, a frase da ministra foi a senha que detonou o processo, tal o arrepio que causou. Expôs, mesmo que tarde, o Poder Judiciário à opinião pública que, estarrecida, passou a ter conhecimento de fatos divulgados durante todo esse mês de janeiro sobre os tribunais de Justiça, Brasil afora. Principalmente no TJ de São Paulo e, mais recentemente, sem que houvesse contestação aceitável, no tribunal do Rio de Janeiro. Lá, descobriram-se os super-salários.

No de São Paulo, o novo presidente do Judiciário tomou a dianteira e iniciou um processo de varredura, exigindo a apresentação das declarações de renda dos juízes e desembargadores que se recusavam a cumprir o regimento. Enquanto tal acontecia, a Coaf deu a conhecer movimentações estranhas, atípicas, em contas bancárias de juízes, o que não significa necessariamente que sejam ilegais. E, também, observaram-se fatos idênticos em contas de servidores do Judiciário. As denúncias não pararam. Tiram, a cada dia, o fôlego da opinião pública diante do que revela a imprensa livre. Em alguns casos, fatos inimagináveis. Outros já eram do conhecimento, mas não chegavam à luz pela ausência de documentos que o sustentassem.

Diante da crise, o Judiciário começou a ver a sua imagem fragilizada. Ele, que até então, era intocável ou presumivelmente intocável. Suas mazelas passaram a ser do conhecimento. O País passou a tomar conhecimento de que a Justiça brasileira não é somente lenta, onde os processos se arrastam preguiçosamente, isso quando não ficam empoeirados nos armários e gavetas. O poder passou a disputar, em imagem e vícios, com o Legislativo, com uma grande diferença: no legislativo os mandatos são renovados; no Judiciário o cargo é vitalício. Sequer, pode-se desvincular juízes em erro do cargo que ocupa. Eles permanecem no serviço público com direito à aposentadoria com proventos vinculados ao tempo de serviço. Um privilégio a mais. Quando afastados do exercício da judicatura, ficam em casa recebendo integralmente o salário e as vantagens que os demais, trabalhando no dia a dia, recebem. Se não fosse uma humilhação para aqueles que procuram zelar pela sua imagem, seria ou é um prêmio para os que não dão importância a honra nem importância à toga que usam.

Este recesso de janeiro é um daqueles verões que ficarão vivos, inesquecíveis para a grande maioria dos magistrados que, sérios, zelam pela sua imagem e pela imagem do poder. O fato é que partir do que ora se observa o Judiciário brasileiro jamais será o mesmo. Sobre ele direcionam-se os holofotes da opinião pública que passa a exigir a abertura dos segredinhos, ou “caixa preta” do poder mais fechado dentre os três, embora  de há muito tenha sido enodoado se entregar, a troco de vantagens, ao poder  à lideranças políticas do Executivo.

Aconteceu aqui por longo tempo, envergonhando a Justiça baiana em relação às demais. Criticavam-na, mas escondiam as suas mazelas. Soberania e independência continuam, ainda hoje, sendo um sonho. O CNJ agora luta para reerguê-lo, mas o corporativismo é um estorvo, inimigo que é do controle externo e aliado dos males denunciados no noticiário do dia a dia.

*Coluna de Samuel Celestino publicada no Jornal A Tarde deste domingo (29)
 

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